ATA DA DÉCIMA PRIMEIRA SESSÃO SOLENE DA TERCEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA LEGISLATURA, EM 25.04.1991.

 

Aos vinte e cinco dias do mês de abril do ano de mil novecentos e noventa e um reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Décima Primeira Sessão Solene da Terceira Sessão Legislativa Ordinária da Décima Legislatura, destinada a homenagear a AGAPAN – Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural –, pelo transcurso de seu vigésimo aniversário a Requerimento, aprovado, do Vereador Giovani Gregol. Às dezessete horas e vinte e sete minutos, constatada a existência de “quorum”, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos e solicitou aos Líderes de Bancada que conduzissem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Vereador Airto Ferronato, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Senhor Caio Lustosa, Secretário Municipal do Meio Ambiente, representando o Prefeito Olívio Dutra; Senhor Celso Marques, Presidente da AGAPAN; Senhor Flávio Lewgoy, ex-Presidente da AGAPAN; Senhor Augusto César Pereira, fundador da AGAPAN; Vereador Giovani Gregol, proponente da Sessão e, na ocasião, Secretário “ad hoc”. Em prosseguimento, o Senhor Presidente fez pronunciamento alusivo à solenidade, convidou os presentes a ouvirem número musical apresentado pelo Senhor Antônio Cardoso e concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador Giovani Gregol, em nome das Bancadas do PT, PMDB, PSB, PCB e PTB, falou da importância da AGAPAN na luta pela preservação do meio ambiente, analisando as causas da permanência e sucesso dessa entidade em nosso Estado. Atentou para a presença das questões sociais e culturais nas lutas ecológicas. E o Vereador Vieira da Cunha, em nome da Bancada do PDT, destacou o significado da luta ambientalista para o resgate cultural e desenvolvimento de um país, saudando a AGAPAN pelo transcurso de seu vigésimo aniversário. A seguir, o Senhor Presidente convidou os presentes a ouvirem número musical apresentado pelo Senhor Jorge Fernando Hermann e concedeu a palavra ao Senhor Celso Marques, que discorreu sobre a história e os objetivos da AGAPAN, agradecendo a homenagem prestada pela Casa. Após, o Senhor Presidente convidou os presentes a ouvirem número musical apresentado pelo Senhor Jorge Fernando Hermann, agradeceu a presença de todos, convidando-os a passarem ao Salão Nobre da Casa para visitar exposição organizada pela AGAPAN e, nada mais havendo a tratar, declarou encerrados os trabalhos às dezoito horas e cinqüenta e dois minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Airto Ferronato e secretariados pelo Vereador Giovani Gregol, Secretário “ad hoc”. Do que eu, Giovani Gregol, Secretário “ad hoc”, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelos Senhores Presidente e 1º Secretário.

 

 

 

O SR. PRESIDENTE (Airto Ferronato): Declaro abertos os trabalhos da presente Sessão Solene. (Lê.)

“A Câmara de Vereadores presta, hoje, uma significativa homenagem a uma entidade que incluiu Porto Alegre no mapa mundial da conscientização da necessidade do homem preocupar-se com a defesa de seus ecossistemas.

A atuação pioneira da Agapan, nos seus 20 anos de existência, tornou a luta pela preservação do meio ambiente não um assunto da moda, mas representou uma tomada de posição contra os elementos e instituições que atentam contra a natureza.

Esta feliz iniciativa do Vereador Giovani Gregol, integrante da Bancada do PT, merece toda a nossa consideração. Nós queremos registrar na história de Porto Alegre o reconhecimento dos representantes de seu povo àqueles que lutaram nesse sentido para despertar corações e mentes sobre a necessidade de cuidar da nossa qualidade de vida. Tenham certeza, todos os integrantes da Agapan, desde seus fundadores até os militantes de hoje, que a atuação da entidade será lembrada, principalmente pelas gerações futuras, quando usufruírem um mundo melhor. Mas só será atingido se este trabalho continuar.

Portanto, queremos transformar esta homenagem como um incentivo a mais para que a Agapan, com toda sua experiência, continue dando um exemplo de amor à vida, mesmo que isto represente, às vezes, uma aparente perda econômica. Cumprimentamos toda a direção da Agapan, extensivamente a seus amigos, associados e admiradores, externando nosso desejo – que é a interpretação da vontade dos porto-alegrenses – de que não esmoreçam e dêem continuidade a esta obra magnífica”. Muito obrigado.

Ouviremos, agora, uma música ecológica, interpretada por Jorge Fernando Hermann.

 

O SR. JORGE FERNANDO HERMANN: Boa-tarde! Essa música é uma homenagem a um animal chamado puma. Quando eu era pequeno, colecionava figurinhas e via nos filmes do Rin-Tin-Tin e achava que só tinha nos Estados Unidos. Qual não foi a nossa surpresa quando a gente cresceu e viu que tinha, nas nossas matas, aqui, esse animal que hoje tem que se esconder no pouco de mato que ainda tem, no pouco de escuridão que ainda resta para os remanescentes dessa espécie se esconderem.

 

(A música “Puma” é interpretada com acompanhamento de violão.)

 

O SR. JORGE FERNANDO HERMANN: Essa música é uma homenagem, também, ao gavião-moro, à harpia, à onça, a todos esses animais que o homem ainda não conseguiu aprender a respeitar, e uma homenagem à Agapan, obviamente.

Obrigado e desculpem o nervosismo, porque nunca cantei numa Câmara de Vereadores. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE: Concedemos a palavra ao Ver. Giovani Gregol, que fala em nome do PT, PMDB, PTB, PSB e PCB.

 

O SR. GIOVANI GREGOL: Sr. Presidente da Câmara, Ver. Airto Ferronato; Sr. José Celso Aquino Marques, Presidente da Agapan, e demais entidades, em especial as entidades ambientalistas, temos várias aqui conosco hoje. São inúmeras as entidades que estão presentes nesta homenagem ao povo de Porto Alegre, através da sua Casa Legislativa, ao 20 anos da mais antiga entidade ecológica brasileira.

 

O SR. PRESIDENTE: Vereador, eu peço licença para dizer que está presente o Sr. Augusto César Carneiro, fundador da Agapan, e o convidamos para fazer parte da Mesa. (Palmas.)

 

O SR. GIOVANI GREGOL: Cumprimento o Sr. Augusto César Carneiro, nosso amigo, ele merece muito mais, é fundador do Movimento Ecológico Brasileiro e, praticamente, o patriarca do nosso Movimento e da nossa Entidade, a Agapan. Eu quero confessar que tive uma noite difícil, porque sofro um pouco de insônia, e ela normalmente se aguça nos momentos de tensão. Daí. pensando, pensando, rememorando, vendo os arquivos, eu desisti de pretender ou de cogitar fazer uma rememoração, mesmo que muito sucinta da história da nossa Entidade, porque é impossível. É totalmente impossível, alguém ainda terá que escrever um livro sobre a história da Agapan, e esperamos que seja um dos seus componentes, que conte a sua própria história, porque, além de ser uma tarefa muito árdua, não é necessário, é indispensável. Porque todos conhecem, todos que estão aqui, e a sociedade rio-grandense conhece a história, o trabalho, o valor e a importância dessa Entidade. A Agapan é uma entidade internacionalmente conhecida e reconhecida. E não há lugar neste País onde essa Entidade não seja valorizada, onde qualquer um de nós que se diga sócio da Agapan não traga comentários elogiosos, não provoque respeito. Viajando do Oiapoque ao Chuí, eu tive essa confirmação pessoal. Em plena Amazônia, em lugares pequenos do interior do Brasil se fala na Agapan e ela é reconhecida. Então, fica difícil falar da vivência, da experiência de vida, porque as palavras dizem muito, mas nunca dizem o suficiente.

Mas alguns detalhes são necessários. Por que a Agapan teve esse sucesso? Sucesso que bem entendido nunca é, e até contra a nossa vontade, nunca é um sucesso financeiro, não é um sucesso econômico, é um sucesso acima de tudo ético e moral, político, se quiserem, e cultural. Essa bandeira de uma entidade que eu várias vezes, como Diretor, ao receber pessoas do movimento de outras cidades e estados, ao levá-los a conhecer a ex-sede de nossa Entidade – na João Telles, ao lado da Cooperativa Colméia – eles se espantavam com a simplicidade franciscana de nossa sede. Diziam: “Mas esperávamos encontrar um lindo prédio, de dois ou três andares, com várias secretárias, telex, fax, telefones”, e não encontravam nada disso, assim como continuam não encontrando, pois a nossa Entidade é pobre. Por que tanto sucesso? Uma entidade que não tem dinheiro, não compra espaço nos meios de comunicação, que não financia campanhas publicitárias, nem políticas? Essa pergunta me fazia hoje, às três horas da madrugada. Algumas coisas me surgiram, algumas palavras podem ajudar a descobrir isso e uma delas é a palavra integridade. A impressionante integridade que mostrou a Agapan nos seus 20 anos de vida, uma integridade que é o segredo do seu sucesso, mas também lhe custou muito caro e que foi muito difícil mantê-la com os dirigentes tão bem aqui representados, e o Presidente Celso Marques sabe disso. Uma fidelidade quase que absoluta aos princípios dos fundadores de nossa Entidade, aqui representada, em especial, pelo nosso patriarca Augusto Carneiro. Pouca gente sabe disso, e acho importante que fique nos Anais da Casa, mas ele foi um dos primeiros idealizadores da Agapan, quando José Lutzemberger, reconhecido como o principal porta-voz, o grande fundador, ainda estava no exterior. Quando ele voltou ao Brasil já encontrou em Porto Alegre um grupo de pessoas que estavam organizando algo, com algumas idéias, mas o grupo não tinha um porta-voz, então escolheu como palestrante – e na época ele se disse também despreparado para a função – José Lutzemberger, e sabe-se o que aconteceu depois. Mas o idealizador, o “cabeça” do grupo foi Augusto Carneiro.

Outra palavra importante é radicalidade, bem entendida, de acordo com suas raízes. Radicalidade, a fidelidade à raiz, à nossa raiz, à raiz da Agapan. A Agapan foi radical? Sim! Foi, é, e continua sendo. Quantas vezes nós discutimos isso e quando éramos taxados, pejorativamente, de radicais, realmente assumimos: somos radicais, porque queremos ver a raiz das coisas e indicar a solução dos problemas através do ataque às suas raízes. E a Agapan, esta radicalidade, como uma árvore que é o símbolo da Entidade, a figueira e a ema, sempre continuou fornecendo a seiva que frutificou. Hoje, são milhares de entidades ambientalistas pelo Brasil afora, são mais de cem de fato e de direito no Rio Grande do Sul que foram num primeiro momento encabeçadas pela Agapan. Em verdade, tivemos outras entidades, companheiras de uma primeira época, como ADFG, Amigos da Terra, que está aqui presente conosco. Neste ponto quero ressaltar que aqui tudo começou depois, mas o movimento ecológico não.

O surgimento do Movimento Ecológico, na América do Sul e no Brasil, através da Agapan, nós podemos dizer que historicamente é contemporâneo ao surgimento de organização do Movimento Ecológico do Primeiro Mundo. Nada devemos aos outros países, claro que aqui o Movimento tem outras características e sofre de deficiências que eles não sofrem, por motivos óbvios. Por outro lado, temos uma capacidade de luta e de improvisação que eles não têm e que admiram em nós.

Outra palavra importante é a palavra combatividade. A Agapan gosta de reuniões e faz, sim, intermináveis reuniões, mas ela tem a característica de que, quando é necessário, quando é chamada, vai às ruas, chama a população e ela é ouvida, e muito ouvida, mudando o destino de muitas ações, e já mudou o destino da Cidade. A primeira luta vitoriosa da Agapan foi contra o corte sistemático que a Prefeitura fazia todos os anos, chamada poda, primeira vitória. A primeira grande luta da Agapan foi contra, na época, o funcionamento da Indústria de Celulose Borregaard. Em plena Ditadura Militar e com todos os meios de comunicação censurados, de repressão política, se conseguiu fechar aquela indústria por mais de cem dias e até hoje aquela indústria, que hoje mudou de nome, que hoje investiu pesadamente, como outras, em controle da poluição, e criou todo um marketing em torno disso, guarda as marcas daquela época. A verdadeira luta da pulga contra o elefante ou contra a baleia branca, mas que na realidade não foi uma luta derrotada. A luta contra o Pólo Petroquímico que muitos diziam, e como tantos que participaram daquela luta, como o Renato, o Prof. Lewgoy, são testemunhas que muitos diziam: é uma luta quixotesca, vocês não vão conseguir nada, mas até hoje o Pólo, lá dentro, investiu em meio ambiente e investe e tem um marketing ambiental por causa daquela luta, senão nada daquilo teria acontecido, embora continuemos esperando os 200 mil empregos diretos prometidos pelo Governador Amaral de Souza. Mas foi uma luta importante e assim por diante.

Aqui em Porto Alegre, por exemplo, a luta pelo Rio Guaíba, pelos nossos morros, pelo Morro do Osso, enfim, pela paisagem, pela qualidade de vida da Cidade, e a Agapan, como uma entidade moderna, ela, na realidade, nunca foi conservasionista, sempre foi ecologista, porque ela sempre fez a luta ambiental dentro daquele patamar que chamamos, hoje, que os teóricos mais recentemente dizem que a luta ambiental moderna deve ser travada nos três patamares da ecologia ambiental, que é esta ecologia mais biológica, de preservação do patrimônio biogenético, das reservas, da ecologia social, porque nós sempre dizemos que a espécie humana faz parte do meio-ambiente, faz parte da natureza. Portanto, a questão social não é negada pela luta ambiental. Pelo contrário, é por ela ressaltada, é por ela também problematizada e enriquecida, porque a sociedade humana está inserida no todo da biosfera e, portanto, a ela submetida, nunca o contrário. E, por fim, a ecologia cultural que envolve a questão cultural, estética, filosófica, ética e, até, se quiserem, mística e religiosa.

De certa forma, a Agapan soube resgatar estas características de trabalhar neste sentido. E, por final, a luta recente contra o Projeto Praia do Guaíba, que levou, segundo a imprensa, mais de dez mil pessoas de mãos dadas, apenas para lembrar a última corrente pela vida na beira do rio. Outras houve pela semana alternativa ecológica, na década de 1980, que teve um impacto muito grande e impediu até agora, pelo menos, a concretização da venda daqueles terrenos à iniciativa imobiliária, com redução dos seus respectivos espigões. Então, a integridade, a radicalidade, a compatibilidade da Entidade, sempre levadas com a devida e justa coerência, explicam para nós, se não totalmente, mas bastante, do segredo da fama, do renome e do sucesso que esta Entidade teve. Hoje, se alguém perguntar, e me perguntam tantas vezes: há mais ou há menos problemas ambientais do que havia em abril de 1971, quando foi fundada a Agapan? Parece-me que há mais, é óbvio que isto não é culpa da Agapan, mas há perspectiva de mudança e há uma consciência que não havia.

Todos nós lembramos, que começamos a Agapan, eu comecei em 1973, e não sou dos fundadores, ecologia era uma coisa mal entendida e muito ridicularizada pelos ignorantes e pelos nossos adversários. Nós éramos “caçadores de borboleta”, aquilo que nós dizíamos jamais se realizaria, e hoje a realidade está mostrando, e nós nos surpreendemos quando vamos às escolas, nas universidades, falando com as pessoas das ruas, como eles têm uma consciência e um discurso ecológico até melhor do que os próprios ecologistas. É isso que nós queremos. Nós queremos que a Agapan sejam milhões, porque ela está defendendo milhões, inclusive aqueles que ainda não nasceram. Coisa rara se as árvores, os animais que nós ajudamos a salvar, se as crianças que não nasceram e que vão viver num mundo melhor ou menos ruim, devido à atividade da Agapan, pudessem votar, a Agapan seria, estaria agora no Planalto, mas eles não votam. Mas não é por isso que a Agapan deixa de trabalhar com o mesmo afinco, e é bom que assim seja, eu acho que a consciência é o fruto da grande figueira que deverá continuar viva durante muito tempo, enquanto ela estiver lutando será viva, e a Agapan sempre lutará. Porque a ecologia, parafraseando uma outra frase a respeito dos generais, é muito importante para estar apenas ao cuidado dos ecologistas.

Quero encerrar lendo uma poesia de Fernando Pessoa, que acho que era um ecologista, embora não falasse nisso, a famosa poesia “Guardador de Rebanhos”, do poeta heterônimo de Fernando Pessoa, Alberto Caieiro:

“Sou um guardador de rebanhos/O rebanho é os meus pensamentos/E os meus pensamentos são todos sensações/Penso com os olhos e com os ouvidos/E com as mãos e os pés/E com o nariz e a boca/Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la/E comer um fruto é saber-lhe o sentido/Por isso, quando num dia de calor/Me sinto triste de gozá-lo tanto/E me deito comprido na erva/E fecho os olhos quentes/Sinto todo meu corpo deitado na realidade/Sei a verdade e sou feliz.”

Como, certamente, neste momento, recordando as lutas da Agapan, são felizes aqueles todos que dentro ou fora da Agapan travaram a mesma luta. Longa vida à Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural. Muito obrigado. (Palmas)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Ver. Vieira da Cunha, que fala em nome da sua Bancada, o PDT.

 

O SR. VIEIRA DA CUNHA: Presidente desta Sessão, companheiro Ver. Airto Ferronato; Prof. Augusto Carneiro, fundador da Entidade, de quem muitas lições recebi, ainda recebo e hei de recebê-las; meus companheiros Vereadores; demais autoridades presentes a esta Sessão; senhoras e senhores.

É com muita honra que represento, neste ato, a Bancada do PDT, Partido Democrático Trabalhista. Sinto-me à vontade para prestar esta justa e merecida homenagem à Agapan, que completa os seus 20 anos de existência, isto porque de uma maneira geral me identifico com os postulados e com a luta da Entidade. Presido o Jovem Movimento Verde do meu Partido, fundado em junho do ano passado para cerrar fileiras com as demais entidades e grupos ambientalistas em busca do respeito à natureza tão agredida pela falta de uma maior consciência ecológica. Hoje, a voz da Agapan não é mais uma voz isolada, a ela se somam a de muitas outras entidades que também se organizaram e atuam pela preservação dos nossos recursos naturais. A Agapan, contudo, ocupa uma posição de destaque pelo seu pioneirismo, pela sua tradição, mas, sobretudo, pela sua firme atuação nas lutas ecológicas, o que lhe valeu a conquista, ao longo desses 20 anos, do respeito e da admiração pública nacional e internacional. Por causa da decidida e eficaz luta da Agapan e de outras entidades, em todo o mundo, é que constatamos que, felizmente, a cada dia, mais a questão ambiental vem se constituindo o centro das atenções da humanidade.

Preocupa-nos, entretanto, o fato da bandeira ecológica estar sendo, muitas vezes, utilizada como instrumento de marketing político dos governantes, sem que aconteçam, na prática, avanços significativos na qualidade de vida dos povos, especialmente os que vivem no chamado Terceiro Mundo, como é o nosso caso. Aqui, no nosso País, assim como nas demais nações que se vêem, historicamente, agredidas e exploradas pelo imperialismo, a luta ambientalista é ainda mais necessária, eis que o processo de formação da consciência ecológica de um povo está diretamente ligado ao resgate da sua identidade cultural, somente possível num país livre e independente. Parabéns à Agapan! Continue assim: firme, corajosa, ativa e independente. A natureza, a nossa geração e as futuras gerações te cumprimentam e te agradecem pela tua heróica e brava luta. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Ouviremos, a seguir, o Sr. Antônio Cardoso, que apresentará uma música ecológica.

 

O SR. ANTÔNIO CARDOSO: Amigos, nós fomos convidados para um Congresso em Brasília e alguém, o Frei João Osmar, pediu que compuséssemos uma música, que fosse junto com o grupo do Rio Grande do Sul para fazer a parte de animação. Estivemos sete dias em Brasília, fizemos uma música, e para nossa satisfação a música faz parte de um livro que está chegando em todas as regiões do Brasil, e mais outros países vizinhos.

Agradecemos a todas as pessoas que lutam pela ecologia. Não somos músicos profissionais, somos ecologista, é por isso que gostamos de cantar ecologia na simplicidade da ecologia.

 

(Canta “Ecologia com amor”.)

 

O SR. PRESIDENTE: Concedemos a palavra a Celso Marques, que é o Presidente da Agapan.

 

O SR. CELSO MARQUES: Sr. Presidente desta Sessão, Airto Ferronato; Caio Lustosa, Secretário Municipal do Meio Ambiente; demais companheiros, Ver. Vieira da Cunha, que agradeço as palavras anteriores; nossos companheiros de luta, Vereadores e Conselheiros da Agapan, Giovani Gregol e Gert Schinke.

Para mim fica um pouco difícil falar a respeito da Agapan depois daquilo que foi dito, e eu também não tenho o brilho que costumam ter as pessoas que têm no verbo, na eloqüência, suas maiores virtudes, e que prodigalizam aqui nesta Casa. Eu gostaria de falar algumas coisas em agradecimento a esta homenagem, em meu nome, em nome de todos que aqui estão, de todos aqueles que não podem estar e em nome dos que não mais podem estar aqui. E me lembro, agora, de um dos seus fundadores, o companheiro Quintas ... (Pausa.) (Palmas.)

Nós, da Agapan, temos nos esforçado nos últimos anos para manter, também, e também mostrar que a Agapan é um grupo, mas também é uma equipe. Acho que conseguimos, nos últimos anos, realmente, sobretudo após a gestão Lewgoy, dar um encaminhamento no sentido de tornar esse grupo que sempre trabalhou na Agapan cada vez mais integrado, atuante e democrático, mostrando à nossa sociedade, tentando mudar a nossa sociedade, mas não mudar a nossa sociedade nos seus efeitos, mas tentar mudar a nossa sociedade na suas raízes. A questão que nos ocupa, hoje, é basicamente desenvolvermos um novo projeto de civilização. Nós, aqui no Rio Grande do Sul, na Agapan, demos início a um processo e pretendemos continuar nesse processo, que é de levar uma mensagem a toda a sociedade brasileira, gaúcha, internacional, no sentido de plantar as sementes de um fruto que, possivelmente, certamente, ultrapassa a duração da nossa geração e talvez até das próximas gerações, que é reconverter o homem a uma outra relação com a natureza. Nós temos tido muito sucesso ao longo desses anos, não há dúvida, conseguimos com que a sociedade gaúcha, brasileira, recebesse a nossa mensagem, se comovessem com a nossa mensagem. Esta Casa sempre tem sido uma caixa de ressonância das reivindicações do movimento ecológico, a Agapan, ao longo dos anos, tem funcionado quase que como uma universidade informal.

Eu me perguntava, há algum tempo, porque eu tenho ficado na Agapan desde 1972? O que tem me prendido nesta sociedade? Cheguei à conclusão que o que me prende na Agapan é uma coisa que as nossas universidades não oferecem, que é o conhecimento, uma informação que parte dos nossos problemas, que parte da nossa realidade e que não vem de fora, que não é imposta como modelo cultural, neocolonial, que nós vivemos, infelizmente, na nossa universidade, mas é, na medida em que somos uma associação, uma entidade ligada ao ambiente em que vivemos, nós temos toda uma vivência, toda uma experiência de enraizamento que, infelizmente, falta nas nossas universidades, falta na cultura brasileira em muitos aspectos importantes.

Eu tenho me perguntado ao longo dos anos: o que nos faz lutar? Eu acredito que o que nos faz lutar é a solidariedade das pessoas, que une as pessoas dentro da Agapan, fazendo com que dentro da nossa Entidade nós sejamos um micro-cosmos, talvez, do que o mundo deveria ser. Na Agapan ninguém é obrigado a se pautar por qualquer idéia, mas nós nos pautamos por consenso, nós temos uma série de consensos fundamentais sobre o mundo e dentro deles nós nos respeitamos. Então, dentro da Entidade temos uma riqueza muito grande que constitui, talvez, o maior patrimônio que compõe isto que o Flávio tantas vezes fala, como sendo o nosso patrimônio moral. Eu acho que nós temos assim desenvolvido na Agapan um sentido de solidariedade entre nós que é também uma experiência preciosa. Temos lá outra coisa que é importante, que é o sentido da cidadania.

Nós, no Brasil, somos um povo que tem um problema seríssimo de identidade. Nós, enquanto indivíduos, no Brasil ainda não constituímos uma cara, somos um povo sem cara, somos um povo sem identidade, somos um povo atomizado na perspectiva do individualismo mais aviltante que não abre perspectiva, em nenhum momento, de uma cidadania mais participativa. O que temos visto lá, ao longo dos anos, não apenas agora, mas no período da Ditadura, durante o período em que tínhamos nossas sessões internas espionadas por órgãos de segurança do País, nossos telefones vigiados, nossa correspondência violada, apesar de tudo isto continuávamos a discutir e tolerávamos a presença daqueles agentes de informações dentro de nossas reuniões, porque nós sabíamos que não tínhamos o que ocultar. O nosso interesse é o mais genuíno e universal, e com esta convicção nunca a repressão teve a coragem de colocar a mão nos nossos militantes, porque a nossa verdade era uma que vai além das ideologias atuais. A nossa verdade ultrapassa este curto espaço de tempo em que vivemos.

Nós estivemos vendo aqui, anteriormente, essas manifestações de música, e uma das coisas também que gratifica a gente da Agapan, que começou esta luta, é ver que nem todos os segmentos da cultura brasileira deram ainda respostas inteligentes ao desafio ambiental, mas temos, sobretudo no campo da música, no campo da arte, já as respostas de uma visão que integra a natureza no campo da arte, nós temos na música, temos na nossa literatura, temos na nossa poesia, temos no nosso cinema uma ressonância muito grande da questão ambiental do Brasil de hoje. Mas é preciso avançar mais.

Alguém me perguntava hoje: o que é prioritário para o movimento ecológico? Depois de pensar um pouco eu posso dizer que o que é prioritário à nossa luta, o horizonte das nossas lutas, do movimento, se situam, sobretudo, num modelo de desenvolvimento econômico. O modelo de desenvolvimento econômico brasileiro é o denominador comum das nossas críticas aos problemas ambientais. Se nós não mudarmos o modelo de desenvolvimento econômico, nós vamos continuar sempre com soluções paliativas. Muito do que nós temos feito no movimento ecológico, até hoje, consiste em remendar, remendar ações que o Estado faz, especialmente; ficarmos lutando contra o Estado que não cumpre a lei, ou que toma iniciativas que não são informadas por uma perspectiva ecológica, seja nos seus investimentos, seja na sua visão de planejamento, seja na sua política econômica. A questão ambiental, eu não tenho dúvidas, é realmente a única perspectiva que vai possibilitar o Brasil a ocupar um lugar digno no concerto das nações. Como eu tenho dito, repetidas vezes, uma das deficiências históricas do movimento ecológico consiste no fato de que até hoje nós não conseguimos, realmente, a adesão dos segmentos importantíssimos de setores fundamentais da cultura brasileira, setores esses sem os quais não se pode pensar num novo modelo de civilização, sem os quais não se pode pensar numa mudança de paradigma, sem os quais nós ficaremos sempre lutando como um movimento isolado, como um movimento periférico. Nós temos necessidade, hoje, no Brasil, de romper uma enorme resistência que existe nas fontes da nossa criatividade cultural. Somente quando nós conseguirmos integrar na questão ecológica a fina flor das nossas capacidades criativas em todos os campos, fazendo com que desse sinergismo surja um novo projeto de civilização, é que nós estaremos realmente ingressando num caminho que os ecologistas consideram que é o caminho certo.

Nós, aqui no Brasil, continuamos perseguindo um modelo de civilização que deu errado, porque não resta a menor dúvida, se existe uma convicção no mundo, hoje, entre os ecologistas, é que o modelo de civilização industrial é um modelo completamente inviável. Nós temos, hoje, nos países industrializados, 6% da população consumindo cerca de            40% dos recursos do mundo, e esse ideal de vida é vendido aos quatro          pontos cardeais como sendo o caminho que deve ser seguido por todos e para o qual nós, no Brasil, devemo-nos dirigir, mas, por uma simples questão de aritmética e também por uma questão ecológica, esse caminho é inviável. Nós, hoje, temos os efeitos globais da questão ambiental, nós temos o problema da camada de ozônio, nós temos o problema das mudanças climáticas, nós temos o problema da diminuição da biomassa dos oceanos, denunciada há tantos anos por Cousteau e outros oceonólogos. Nós temos problemas gravíssimos que não estão sendo enfrentados responsavelmente pelos governos, hoje, no mundo inteiro.

Apesar de se falar na questão ambiental hoje na mídia, dando uma falsa impressão de que a nossa civilização está seriamente engajada em modificar a sua relação com a natureza, nós não vemos sinais efetivos e evidentes de uma mudança, porque esta mudança é mais profunda, essa mudança também não pode se dar a curto prazo. Fala-se, hoje, a última palavra em termos de desenvolvimento econômico, o chamado desenvolvimento sustentável. O desenvolvimento sustentável foi um conceito elaborado pela Comissão de Economia e Meio Ambiente da ONU, o chamado “Relatório Burtland”, e representa a primeira tentativa de se colocar a questão ambiental dentro da problemática do desenvolvimento econômico. Mas nós, que já nos debruçamos sobre o chamado “Relatório Burtland”, vemos esse relatório com uma série de problemas que podem se traduzir, em última análise, numa fórmula que aparentemente resolve a questão ambiental, integra a questão ambiental, mas continuando a manter os países do Terceiro Mundo neste processo neocolonial em que nos vivemos. Hoje, nós temos no Brasil os preparativos para a Conferência Eco-92, e nos preocupa muitíssimo o fato de que ao longo de vinte anos de movimento ecológico no Brasil não existam propostas claras, objetivas, no sentido de questionar a ordem econômica internacional, questionar esse modelo civilizatório da industrialização e de se criar um outro projeto. Nós estamos às vésperas desse encontro mundial e no Brasil estamos engatinhando numa discussão, enquanto que os países do Primeiro Mundo já têm posições prontas, formadas e discutidas.

E mais uma vez parece que a história está passando à nossa frente, e nós não estamos dando uma resposta à altura. Precisamos, aqui no Brasil, trazer a questão ecológica dentro das nossas reivindicações de um modelo de desenvolvimento autônomo. A questão ecológica, hoje, abre para o Brasil, como parceiro internacional, uma série de alternativas de negociação extremamente poderosas para se colocar na banca das negociações internacionais. E, no entanto, o nosso Governo, que não tem compromisso com a soberania e como não tem uma visão ecológica, é incapaz de colocar nas negociações exigências e postulações no sentido de modificações deste quadro internacional que é catastrófico, do ponto de vista ecológico, do ponto de vista de um futuro quase que imediato.

Temos, hoje, questões que estão sendo discutidas em nível internacional, mas que no Brasil elas não são sequer mencionadas, como a questão de um governo mundial. Diante de problemas como o da camada de ozônio, das devastações das florestas tropicais úmidas, das mudanças climáticas, de uma série de problemas globais, hoje, já se começa a veicular a questão de se estabelecer um governo mundial destinado a pressionar e coibir as ações de governos individuais que levem a deterioração ambiental em escala global. São os chamados controles seletivos globais. Dentro de poucos anos, possivelmente, vamos ter uma legislação rigorosa e nada amigável no sentido da necessidade do controle da natalidade. Essa liberdade que hoje temos de procriar livremente, possivelmente dentro de uma década cesse de existir, diante da situação gravíssima que nós vivemos hoje em termos de explosão demográfica. Esse é um dos pontos que, possivelmente, vai incidir brevemente uma política mundial que não vai ser nenhum pouco complacente com esse direito que nós temos, individual, até o presente momento, para não falar em outros problemas. Mas o que alarma é que nós não temos uma discussão desses problemas internacionais no Brasil, e o Brasil não tem uma posição formada no sentido de reivindicar, exigir, em nível internacional, certas mudanças estruturais no plano da economia e no plano da política, que mudem esse quadro desfavorável ao nosso País, que hoje é um grande exportador de recursos naturais e de capitais para os países industrializados. Nós, que já somos pobres, fazemos eco a uma passagem da Bíblia que diz assim: “aqueles que tudo têm mais lhe será dado; aqueles que nada têm mais lhe será tirado”.

Urge que nós organizemos as nossas lutas e levemos adiante as nossas lutas do movimento, sobretudo, tendo claro que o nosso horizonte é um horizonte mais longo, que o nosso horizonte é um horizonte que vai além do quadro da nossa política atual. Toma-se, hoje em dia, a democracia como sendo a última palavra em política. E de fato a democracia representa um legado político certamente insuperável no qual a humanidade tem todo o direito de depositar suas esperanças. Mas, na perspectiva ecológica, o conceito de democracia serve apenas para criar uma igualdade entre os homens, ou uma aspiração de igualdade, ou um ideal de igualdade entre os homens que tem como contrapartida uma tirania da humanidade sobre a natureza. O horizonte do movimento ecológico, do plano político, está além da democracia, porque se coloca para o movimento ecológico a necessidade de chegarmos à biocracia, do homem deixar seu pedestal, deixar de se considerar um ser acima dos demais seres vivos e reconhecer a vinculação direta de sua sobrevivência com a espécie, ao reconhecimento da necessidade de minimizar a sua agressão, a sua destruição, o seu impacto ambiental em relação ao demais seres vivos. O horizonte do movimento ecológico é o horizonte da biocracia, ela representa a ampliação da idéia de democracia, incluindo a vida dentro da esfera do direito e da esfera do dever, da política, da economia.

Na Agapan, desde sua fundação, sempre perguntamos sobre o sentido de nossa luta. Nos momentos de depressão, perguntamo-nos se vale a pena, se não somos, no fundo, os lutadores por uma causa perdida. É, talvez, impossível de se responder a essa pergunta. Uma coisa é certa: se formos confiar no que a ciência hoje nos fornece de conhecimentos, certamente a existência da vida neste planeta começa antes do homem e acabará depois do homem. A humanidade tem uma passagem temporária neste planeta. Mas a questão ecológica, hoje, traz um problema da mais alta gravidade, que diz respeito ao sentido da vida humana neste planeta, ainda, sobre o sentido das vidas individuais e das instituições. Quando contemplamos o problema em seu aspecto maior, que basicamente é o aspecto que dá força ao movimento ecológico, verificamos a possibilidade efetiva de o homem vir a destruir a ecosfera e abreviar a sua passagem por este planeta, quando ele poderia ter uma existência muito mais longa e muito mais interessante. Hoje, se coloca a questão do significado da civilização, do significado desta pluralidade de culturas que existiram e existem sobre a terra, cada uma dando uma resposta ao problema da vida.

Hoje, se coloca a necessidade de resgatarmos tudo o que foi feito pela humanidade melhor, no sentido de integrarmos toda a experiência humana para realizarmos um ideal completamente novo, para termos um novo começo que é de, resgatando tudo o que o homem produziu de melhor desde as suas mais humildes manifestações nas culturas primitivas até as mais sofisticadas criações da ciência e da tecnologia, nós chegarmos a realizar este ideal, que é de integração da humanidade com a natureza, que é de pacificação das relações do homem com a natureza, que tem em si embutido, também, todas as utopias sociais que alimentam a humanidade, especialmente nos últimos quatro séculos, que é também da humanidade, de reconciliar consigo mesma, e ao se reconciliar com a natureza isso sirva de alavanca para a reconciliação dos homens entre si numa nova civilização, numa nova sociedade que seja capaz de dilatar ao máximo o prazo de existência da humanidade sobre a terra até o dia em que o sol não seja mais a nossa fonte, até o dia em que não tenhamos mais condições de sobreviver, até o dia em que se consigam outras perspectivas tecnológicas com as quais nós mal sonhamos, que poderão nos por a salvo, talvez, do que seja inevitável.

Essas tarefas todas se colocam como o horizonte do movimento ecológico, eu acredito que se na Agapan, ao longo desses 20 anos, nós tenhamos conseguido manter esta fidelidade que o Giovani acentuou no seu discurso aos nossos princípios e diretrizes que os fundadores da Agapan criaram, são sem sombra de dúvidas, porque estas idéias têm estado sempre presentes nas lideranças da Associação e no seu quadro de militantes mais ativos. Agora, a questão ambiental, ela tem uma raiz muito emocional, muito afetiva.

Quero concluir, deixando para vocês uma descoberta que fiz numa recente reflexão. O poeta Mallarmé dizia que a criação poética consiste em dar novas palavras, um significado novo às palavras da tribo. Eu acho que uma das dimensões poéticas do Movimento Ecológico é quando descobrimos novos sentidos nas palavras que estamos acostumados a ouvir, e num destes momentos poéticos de descoberta, eu descobri que a palavra querência, que é uma das palavras consagradas do vocabulário gaúcho, com significação afetiva, tem um significado ecológico que encerra em si tudo que a ecologia tem de mais importante para nos ensinar. A palavra querência, a querência tem conotação de querer, e nós, como homens, nós queremos agora, esta palavra tem um apelo que vai além desta visão do nosso querer político informado, exclusivamente, por uma visão antropocêntrica. A querência significa um querer que vai além do querer do homem, significa um querer da natureza, significa aquele apelo que a natureza exerce sobre a nossa sensibilidade e nos cativa e que nos abre uma perspectiva de integração.

Hoje, um dos grandes problemas ecológicos e um dos grandes problemas culturais, digamos assim, é que na nossa sociedade industrial nós não ouvimos a querência, nós não temos a sensibilidade para captar o apelo que a querência faz a nós. A civilização industrial, antropocêntrica, ela se caracteriza por querer adaptar o homem, adaptar a natureza ao homem, enquanto que a palavra querência, ela é compreendida no sentido também de perceber a vocação específica dos lugares e perceber a vida que palpita em cada lugar de uma forma completamente única. Consiste, exatamente, no processo do homem se adaptar aos lugares onde ele vive e de construir a sua vida dentro do princípio de reverência pela vida, ou seja, de causar o menor dano, que é o princípio fundamental da ecologia. Para mim, foi uma grande descoberta esta palavra querência no sentido de querer, que é um querer da natureza, que também tem que ser um querer do homem. Esta união, do querer do homem com o querer da natureza, ela tem um significado assim extraordinariamente rico. E eu fico me perguntando quem criou um dia esta palavra, esse momento misterioso em que alguém criou esta palavra e criou um conceito que ficou dormitando na linguagem talvez durante séculos e milênios, até num determinado momento a gente redescobrir este significado originário e essa palavra se transformar numa espécie de luz.

Eu já tomei o tempo demais de vocês, hoje, vocês desculpem também até essa minha emotividade, mas gostaria de agradecer novamente esta homenagem em nome de todos os que estão aqui e os que não estão e dizer a vocês que nos gratifica muito esse reconhecimento que esta Casa, hoje, nos propicia, porque o sentido do nosso trabalho é um sentido voltado totalmente para a coletividade, e no momento em que uma Casa como a Câmara Municipal de Porto Alegre, os representantes do povo desta Cidade, nos prestam uma homenagem, nós nos sentimos realmente homenageados e reconhecidos, porque o que estamos fazendo é voltado para o interesse da coletividade e só se realiza, efetivamente, no momento em que a coletividade reconhece esse nosso trabalho. Era isso que eu queria dizer e agradecer a todos. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Nós ouviremos mais uma música ecológica, interpretada por Antônio Cardoso.

 

O SR. ANTÔNIO CARDOSO: Voltando à querência, a gente viu tudo derrotado, tudo, tudo. Terminou a alegria. As lembranças dos tempos bons voltaram, das matas, dos papagaios, de tudo aquilo, da siriema, do avestruz, de todos aqueles animais maravilhosos que hoje não têm mais o seu espaço. Aí, eu disse para o meu velho pai, que está agora com 94 anos: “Que saudade! Quem lavrou este chão, meu pai?”

 

(É interpretada a música “Quem lavrou este chão?”, com acompanhamento de violão.)

 

O SR. PRESIDENTE: Nós cumprimentamos e agradecemos a participação dos nossos compositores e cantores, o Jorge Fernando Hermann e o Antônio Cardoso. Ilustres componentes da Mesa, os amigos Celso Marques, Prof. Flávio Lewgoy, o Secretário Caio Lustosa, Augusto Carneiro, os Vereadores Giovani Gregol, Gert Schinke, Ervino Besson e Clovis Ilgenfritz, que estiveram presentes nesta Sessão. Senhoras e senhores, em nome da Mesa da Câmara Municipal de Porto Alegre e em nome de todos os Vereadores desta Casa nós cumprimentamos a Agapan pelo transcurso do seu 20º aniversário, registramos e agradecemos a presença de todos.

Convocamos os Srs. Vereadores para a Sessão de amanhã, à hora regimental. Convidamos os presentes a passarem no salão aqui atrás para visitarem a exposição que ali se encontra e que é elaborada pela Agapan. Boa noite a todos.

 

(Levanta-se a Sessão às 18h52min.)

 

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